quinta-feira, 29 de abril de 2010

eu quero


(poesia)

porque quero uma vida só minha
em que dedos em riste, abusados
apenas apontem para o outro lado
que queira e possa abusar da gula
e que os manuais e as dietas, mágicos
não passem do portão
quero andar pelado pelo quintal, e
dizer poemas de gente interessante
dormir com todas as luzes apagadas
levantar sem a certeza de que clareou
traduzir espontaneamente o desejo e,
sem os grilhões existenciais que escraviza
não adorar a qualquer divindade, nunca, pois
jurar que a natureza saiba o que faz sempre
acreditar que quem tenha 32 dentes
possa causar suspeição entre os iguais
que meus amigos possam me amar sem me ver
que tire onda por ai igual gandaia
sem deslize é um universo particular
onde ninguém olha, tampouco se espelha
ter um pássaro majestoso que pode sumir
me representando na foto na maior
não me utilizar de subterfúgios idiotas
para me atirar nem ai na lombra, funesto
que até pareça exótico, se é que me entende
achar que Drummond, Neruda, ou Rosseuau
narraram a mesma epopéia com intuito diverso
respirar a maresia quando acham que alga incomoda
poder ler tal actinomante os destinos das criaturas
e reverberar incógnito pelas veredas da vida
e não parecer que está enchendo lingüiça
como inadivertidamente se diz por ai
que saia de cena como entrei, sem delonga
desejando que amanhã outro dia apareça.

Dedicatória: dedicado a leitores do saite

Publicado em 06/03/2010 03:19:35 - 15 leituras



Ainda não leia meu nome

(poesia)

Sou o sereno que molha a grama
alumiada pela lua nova, ou cheia
a bebida que embriaga o noctivago
em devaneios estúpidos, etílicos
não, ainda não leia meu nome
que talvez não se encontre no rodapé
nem em nenhum outro referencial
quem sabe dê nome a alguma rua
ou diria uma lápide fria qualquer
sou a brisa morna das manhãs de verão
a chuva ácida que tempera o solo
a água sem oxigênio que corre no rio
o excremento do animal jovem, adulto
mas, ainda não leia meu nome
pois estou há alguns graus a bombordo
e não mais o escrevo em papel
tampouco assino com garatuja indescritível
sou a idéia que se perde em aforismos
ecléticos que não dizem nada e dai
sou a frase sem acento e sem sentido
o poema sem rima que teima em ser livre
dentro dessa métrica absurda de fim de noite
entretanto, ainda não leia meu nome
porque não me reconheceria mesmo que estivesse
diante de si, com meu chapéu sujo e descorado
meu jeito maltrapilho e deselegante da roça
meu hálito desagradável das manhãs, por tudo
isso devo dizer-lhe que meu nome não tem
nenhuma importância hora dessas.




Dedicatória: dedicado a leitores do saite

Publicado em 16/02/2010 22:58:04 - 103 leituras



dançar conforme a música


(artigo)

A colaboração dos autores para esse saite é uma atitude super democrática, já que temos um histórico esdrúxulo de lermos pouco, então qualquer iniciativa que nos mova por esse caminho é pra lá de louvável. Claro que o saite nos orienta a mandarmos nossas escritos o mais organizado possível, mas vira e mexe nos deparamos com alguém que comeu bola sem a tal auto avaliação e joga um produto rudimentar, tosco e até com cara de inacabado, pois bem estou longe de ser um escritor, pelo menos nos moldes dos que vejo no saite, são organizadíssimos e me fazem parecer mais amador ainda, portanto antes de me boicotarem tentem entender o amadorismo que impera nesse escriba que vos tecla e, sinceramente, obrigado por me lerem e emitirem suas opiniões.

Dedicatória: dedicado a leitores do saite

Publicado em 31/01/2010 13:52:23 - 110 leituras

As flores murcham e viram adubo


(poesia)


O que dizer se a vida não são só flores
se os destinos se cruzem numa boa
e nem todos resultam em amores
alguns, até cruzamos a toa

passamos pela vida como descemos um tubo
a existência é como pegar uma onda
mas longe do mar, sob o chão, viramos adubo
e tanto papo furado, tanto caô, tanta milonga

o poema é ruim, soa mal aos ouvidos
como versos de uma trágica canção
com rifs, dó, ré, mi, fá e sustenidos
um verdadeiro desafio à falta de inspiração

Uma folha de papel solta na ventania
uma curtição na introspecção amarga
literalmente, um leão abatido a cada dia
ou o lombo calejado para assentar outra carga.

Dedicatória: dedicado a leitores do saite

Publicado em 24/01/2010 02:41:31 - 133 leituras

chutar o pau da barraca


(prosa poética)

andar, como quem anda sem rumo

sentir, como quem sente a brisa que vem do mar

equilibrar, como quem precisa de prumo

vá, como quem tenta e precisa chegar

soe, como quem precise de renovo

buzine, como quem deve ser ouvido

zombe das desgraças, como quem não está nem ai

rasgue páginas virtuais, como quem destrói a utopia

chore lágrimas de crocodilos e o leite derramado

e, repense, como quem quer existir

Dedicatória: aos descontentes de plantão e aos leitores do saite

Publicado em 24/01/2010 00:41:31 - 115 leituras

quarta-feira, 28 de abril de 2010

dias encharcados



A chuva caiu sem parar

os muitos milimetros encharcaram os dias

o cheiro de mofo impregnou os ambientes

a terra molhada ameaça vir abaixo

numa avalanche de lama e caos

os ponteiros do relógio já nem se mexem

o telefone intransigente emudeceu

a energia não teve força para se manter

a velha lamparina a querosene emerge das

quinquilharias e da ferrugem, alimenta-se

de um trapo enrolado embebido em óleo

de comida e me dá uma chama bruxuleante

que confunde o que vejo nas paredes vazias,

rachadas e tortas desse meu esconderijo,

eu tenho vontade de chorar

contenho-me apressado, pois não posso

jogar um milímetro sequer, tudo pode descer

ladeira abaixo. E não posso ser soterrado de novo.



Nesse abrigo onde me encontro com outros iguais

reflito as causas do meu isolamento espontâneo

e dou graças aos céus, por divergirem de mim

senão os números da tragédia incluiria os demais seres que amo

neste meu vale desencantado.

Dedicatória: dedicado aos encharcados leitores do saite

Publicado em 07/03/2010 17:27:30 - 25 leituras


Foi cocaína

NEM COCAÍNA E MUITO MENOS AS CIGANAS - Foi cocaína? - Nauam. - Você precisa falar a verdade, nós vamos fazer um exame de qualquer maneira, mas eu preciso saber. Isso vai interferir na sua medicação. Foi cocaína? - Nauam porraaa. Reméudio para eumagrecer! - Que remédio? Eu sempre quis ser uma enfermeira por um dia. Por exemplo, poderia ser em um dia que eu estivesse afim de maltratar alguém. Para responder a pergunta dela pedi caneta e papel. Escrevi. “Minha senhora, o meu queixo entortou porque eu tomei dois comprimidos de fenoproporex e cinco de fluoxitina. Para que tudo descesse, eu bebi uma caipirinha, apenas uma caipirinha, que encontrei sendo feita por um rastafári. Você sabe que categoria tem essas cachaças. Acho que exagerei, se você me der plasil e gligose eu vou ficar melhor. Mas será que eu estou tendo um AVC?” Ela riu e saiu da sala de emergência. As pessoas passavam e me olhavam com o queixo torto.Eu não enxergava direito, por causa do efeito do metanol que deveria estar na cachaça. Maltido rastafári, eu confio neles por causa daquela filosofia paz e amor, reggae e maconha, parecem ser honestos. Mas agora sei que não devo confiar em pessoas que não tem residência fixa. É a lei da sobrevivência. Tampouco confio em ciganas. Eles andam pelo centro, com aquele papo; - Deixa a tia ler a tua mão? - Tá. - Hum, a tia tá vendo amiga falsa que quer amarrar a sua vida. A tia vê que ele te ama, mas que a amiga quer separar vocês. A tia vai rezar por você. Dá uma ajudinha pra tia? Dei cinquenta centavos e quando já estava no metrô dei falta do meu anel de prata. Não aprendi nada com a vida, se tivesse aprendido não tinha tomado a cachaça do hippie rastafári, batizada de metanol, não estaria nesse hospital com cara de hotel e muito menos com o queixo torto. - Olha você pode estar com um problema neurológico, por isso o desvio do seu maxilar. - Auvêcê? - Não é derrame. Mas aqui na emergência nós não fazemos exames mais profundos. Vou te dar 2ml de Valium, é um relaxante muscular. Eu escrevi. “Porque vai me dar diazepam, eu já me entupi de drogas para emagrecer e estou com o queixo torto, minha mandíbula dói. Porra.” Apaguei o porra e entreguei o bilhete a ele. - Você entende de remédios hein? Nem vou perguntar como sabe o nome genérico do Valium. Isso é a primeira coisa que eu posso fazer. Não vai ter mais problemas com você e muito menos com o seu queixo. Esse foi o dia em que eu apodreci viva. Eu não andava bem, tinha problemas com comida. Comia um rodizío de massas, tomava sorvete, enfiava o dedo na goela, depois comia um chocolate e ia dormir. Tive anemia, meus cabelos caíram eu fiquei feia, e agora estou aqui por causa da combinação “veneno de rato” que eu arrumei de um médico lá de São Gonçalo. O matador. Vinte reais a consulta, as gordas entravam e saíam do consultório, eu era mal vista, afinal era semi – gorda. O veneno que entortou a minha cara, deu tiuti. E se não voltasse ao normal? Eu ia dar beijos ao vento pelo resto da vida. Injetaram o Valium… Meu queixo desentortou, rápido. Faz dois meses que estou nessa clínica. Depois do incidente do queixo, fiquei com medo, vendi meu carro, saí fora do meu trabalho estressante e me internei. Aqui tem pessoas com vários vicíos, mas tem uma ala “Distúrbios Alimentares”. Fiscalizam o meu quarto, atrás de comida escondida. Não que eu não possa comer, posso comer o quanto eu quiser, aqui não é SPA, mas se comer muito, posso ter uma crise e tentar vomitar. Tenho cicatrizes nas mãos, de arranhar os dedos nos dentes, aliás perdi dois. Dois dentes, algo como acabar com o esmalte deles, aqui tem dentista, eles explicaram. Não engordei, mas também não emagreci. Ontem iniciou a semana da comida macrobiótica, uma merda, avisei que não ia comer. Aí acharam que eu também estava anoréxica. Veio o chefe da terapia ao meu quarto e eu tive de explicar que preferia feijão com arroz e tal. No final ele perguntou, teve a infelicidade de perguntar; - Tem mais algum problema querida? Drogas? Cocaína? Respondi que não tinha problemas com drogas e pedi gentilmente que saísse do quarto. Quando eu estava sozinha, pensei que a pior coisa era se entupir uma semana de comida macrobiótica e lembrei do dia em que virei uma compulsiva. O dia do mousse de maracujá, a sobremesa repetida quatro vezes. O resto são todos os fatos tristes que me levaram até aqui e que nunca foram e jamais seriam previstos pelas ciganas. 2006.

Dedicatória: dedicado aos que torcem o nariz e leitores do site

Publicado em 12/01/2010 05:03:45 - 392 leituras

de onde pinta as pirações

crônica)

o que choca aqui tem bem menos peso ali, tampouco abala alguém acolá
o certo é que tudo importa tão pouco nos nossos dias que nem mesmo nos damos ao trabalho de traçar paralelos entre os escândalos políticos, artísticos ou morais, se há imoralidade no ar significa que somos imorais desde sempre, extinguimos muitas formas de vida que aqui habitavam, agora a intenção é acabar com o habitat e cá pra nós estamos tendo sucesso.Os escritos levavam a crer que quase tratava de um pseudo apocalipse inspirado num realismo mágico que ninguém nota nem ao menos espera e,para os que esperavam mais calcado nesse interim com alguma opção de escolha finalizar a idéia na ultima linha dessa folha!

Dedicatória: dedicado aos pacientes leitores do saite

Publicado em 02/01/2010 23:39:01 - 643 leituras

Desequilíbrio do descalabro


O caminhar débil denunciava certo desprezo para com o resto da humanidade. Decerto, sem a noção que o abstrai, tampouco captava a inutilidade existencial que o levara até ali. Há muito, a vida tinha lhe fugido ao controle, primeiro eram aquelas vozes que ditavam o que fazer, não ligava, era besteira, onde já se viu? Depois eram aqueles períodos intermináveis de completo esquecimento. Brancos enormes que duravam dias, nem sequer lembrava onde morava. Caminhava, tinha bolhas na sola dos pés que ardiam deixando-o mais irritante que o habitual, inescrupulosamente entorpecido pela circunstância esbravejava maldizendo aquelas solas fracas que trazia. A vastidão azul daquele céu com nuvens brancas desfilando no horizonte distante complementava o cenário entrecortado por uma encosta de um negrume escuso pelo por do sol já em voga. O passo com aquela ginga já característica insinuava uma afronta iminente, onde alheios, podiam supor mil facetas de um desequilíbrio latente e porque não dizer; certa enfermidade mental, nunca diagnosticada. O olhar circunspeto que lembrava o de um peixe ainda dentro d’água com a diferença de onde e para onde as bolas pretas miravam. Fitava o tudo, o nada. Era tudo muito confuso dentro de si e em seu incômodo. À sua frente, o infinito, seus contornos vagos, era como um pano de boca, preste a descortinar à hora do espetáculo. Pensamentos desconexos faziam-no urrar pelos tubos na irregularidade de seu corpo e sua alma já aleijada só um desejo consciente, algo que se fixou aos tecidos cerebrais, onde estaria a última curva? Na beira da estrada avista uma bica, onde algumas senhoras enchem latas e carregam na cabeça, atravessam a rodovia e embrenham-se numa trilha do outro lado de uma estrada paralela. Quando todas as pessoas vão embora resolve tomar um banho e passa a despir-se sem receios, fazia dias que não tomava um bom banho, nem se lembrava mais. O céu azul-turquesa torna-se rubro num matiz prateado de uma lua já despontando no lado oposto à bica, malditos flashes, precisava colocar a roupa, mas tinha de deixar a água escorrer, senão teria frio e isso não era bom. O pano de boca cai, suas luzes e seu brilho pareciam pisca induzidos por alguma espécie de comando. Põe suas vestes e encaminha-se calmamente com suas bolhas a lhe incomodar, ouve vozes com tanta clareza que resolveu tratá-las como de almas cansadas, perdidas, ele sabia onde elas estavam. Sente uma repulsa que insatisfeita transborda como lágrimas a brotar dos olhos, mas na forma de um liquido espesso, fétido e podre, parecia vir das bolhas, malditas bolhas! A indiferença era uma constante e, pervertida, se sobrepunha ao cansaço. Sua trajetória levava-o no inevitável ir. Assim vivia seu desprendimento que ofuscava seus planos, irregulares. Com o andar vacilante, indo pé ante pé pelas estreitas veredas d’uma existência quase inútil dentro das possibilidades absurdamente prováveis. O improvável era todo o asco que sentia pelos seus semelhantes, uma vez que até o ato da comunicação ficou comprometido, porque os demais não conseguiam acompanhar seu desfiar de conjeturas banais de jeito tão apaixonado que ninguém merecia saber como ele funcionava ninguém. “Era de berço” como dizia, algo que não se pode mudar estava incrustado em si, estuporado vagava por ai com um ódio mórbido de quem se odeia com plena consciência do espaço ocupado dentro de um convívio desprovido dos paralelismos na sua idiotia. O fim de tarde e o início da noite trás aquela aura lúgubre de todos os fins de tardes e inícios de noites que antecedeu aquele que por certo ainda iria adiante. Lê um artigo de um caderno de economia, jogado dobrado por alguém que não dominava nem o básico naquilo, mas ele manjava alto, finanças, investimentos, cotação de moeda estrangeira mentalmente ia pormenorizando de “a” a “z” o mercado de capitais. E esbravejava em voz alta: “como é que não entendem de coisas tão simples?” Ignora completamente o quão estava dolorida aquela caminhada, seus pensamentos são melhores não o torturam como a dor física que muito fê-lo parar para massagear os calcanhares e as solas ardidas. Absorto, caminha tomada por uma manchete de escândalo financeiro num país asiático em que o culpado fora condenado à morte. – “Aquilo era papel de gente?” Sentencia. A estrada vai se transformando em uma grande avenida bastante iluminada e com muitos carros indo e vindo, era a efervescência da metrópole em seu grau máximo, um… Pronto, estava em casa novamente, aquele era o seu lugar só não conseguia lembrar-se de nenhum endereço. “Ah! Pra Quê? Essa cidade é minha.” Vai pelo canto da calçada pela grande avenida que o leva a região central do lugar. Vê verde de uma bela praça que para não fugir ao que fora estabelecido sei lá por quem quer que seja e que pactue de tamanhos descalabros, palavra estranha que contrasta com algumas árvores frondosas, circundando a praça um pequeno comércio com suas marquises terminando no pé de um viaduto que se elevava para o centro, encontra um cantinho mais escuro debaixo de uma delas e resolve dar uma descansada. No momento sua mente não se ocupa com nada e, tomado por todo cansaço daquele dia pega no sono sobre uma caixa de papelão desmontada como cama e seu caderno de economia como travesseiro. Sob as estrelas daquela noite sombria sonha que alguns jovens rapazinhos, aqueles que riem de si quando está a falar sozinho, estão batendo em seus córneos com pedaços de caibros, sente um liquido quente a escorrer pela face já suja das horas distante do banho. Era só um sonho, pois havia tomado banho e volta a dormir novamente, teria outros sonhos para não acordar jamais.

01/03

Dedicatória: aos meus poucos amigos e leitores do saite

Publicado em 02/01/2010 14:47:53 - 397 leituras